sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Dia 26

Caro Papa Francisco,

Quero te fazer um pedido. Espero que o senhor tenha a disposição e os meios hábeis para analisá-lo com carinho, na medida em que te for possível.
Ajude-nos a comemorar o dia 26. Mais do que antes, tenho reparado no empenho que todos temos em felicitar os nossos queridos nos dias 24 e 25. Os asilos, casas de repouso, orfanatos e hospitais ficam cheios nesses dois dias. Parentes solitários vêem suas casas repletas e se alegram em oferecer hospitalidade e um sorriso. Mas no dia 26, lotadas ficam as estradas das praias e dos interiores externos. Nosso contato com o mundo limita-se ao cheiro de borracha queimada no asfalto. Aí os lares solitários emudecem.
Francisco, crie um novo estatuto, convoque um novo concílio, proclame uma nova dependência! Que ela seja parte das comemorações da vida de sempre de todos os dias, como se ficassem guardados carinhosamente mais alguns presentes para o dia seguinte.
Que depois das balbúrdias gastronômicas venha a paz da companhia. E que depois do êxtase do consumo, sintamos o prazer perene da compaixão... Mas, caro papa, tem que ser no dia 26! Porque já, neste dia, esquecemos de tudo que nem sequer havíamos lembrado, na forma divina.
Então, pensando bem, vamos comemorar o natal no dia 26! O que o senhor acha? Depois de termos passado por dias de intensa interação social numa inteireza suspeita, poderíamos, se for o caso e o senhor concordar, lembrar do Cristo e todos os ensinamentos de compaixão e amor, da nossa mera transitoriedade neste mundo ilusório, da importância de reconhecermos nossos companheiros espirituais que conosco farão a travessia desta existência.
Mas, Francisco, para isso precisamos de uma nova data, um novo decreto, uma nova convenção. Uma nova lei que nos diga como é incrível surpreender um avô no asilo depois que o papai-noel já tenha passado, ou de fazer uma visita para aquela tia solitária que reclama de dores na alma, nos sonhos, nas pernas. Se o senhor realmente aceitar meu humilde pedido, dê-nos a coragem de olhar para os moradores de rua, pedintes, crianças desamparadas, assaltantes, assassinos e excluídos com o mesmo olhar amoroso com que olhamos para os que gostamos e incluímos diariamente nas nossas orações parciais. Sei que é possível, mas sem sua mensagem o mundo não quererá acreditar nestas palavras desconexas e trôpegas.
Por isso, caro papa Francisco, estou pedindo o que peço: um dia depois de amanhã com a mesma preocupação dos amigos que, secretos, presenteiam o outro com o cuidado de agradar, mas que agora não esperam mais o presente de volta. Ajuda-nos a ter  um dia 26 de amor, alegria, compaixão e equilíbrio em nome de todos os seres que desejam superar o sofrimento e tudo o que estiver ligado a ele e que anseiam pela felicidade genuína e por todos os seus caminhos e atalhos sutis.
É o que te peço de dia 26.
Feliz dia 26.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Sonhos

Sonhamos o tempo todo. É realmente curioso notar nossa relação dispersa com o momento e com a realidade. Arrisco-me a pensar que no máximo criamos uma relação estável com as verdades relativas nossas e do mundo.
Atualmente, ganhamos objetos que nos fazem sonhar ainda mais, compondo em frações de segundos realidades alternativas com fotos, gráficos, comentários e todo tipo de interação instantânea. 
Ou seja, seguimos dormindo! No trânsito é fácil perceber (perceber?..): parados ou em movimento nossas mentes estão quase o tempo todo longe, reconstruindo o passado ou delirando num movimento  de futuro incerto, inerte. 
A grande prova disso é que nem sequer notamos se estamos respirando ou não e que nosso olhar logo fica distante, assim que acreditamos estar prestando atenção em alguma coisa. 
É incrivelmente surpreendemente a nossa  capacidade de lidar com várias realidades paralelas e não estar em nenhuma. Revelador, porém, é descobrir que não precisamos caminhar assim. Bastamo-nos apenas com uma atenção, com um foco que, de tão rico e abrangente, coloca-nos o tempo todo em contato com a verdadeira realidade. E é tão simples que não dá pra entender porque passamos tanto tempo sem nem desconfiar. Função básica e incessantemente presente: respirar com consciência. Apenas e sempre. 
Sem descartar nada. Integrando tudo e a todos com o olhar, com a escuta, com a alegria e com a coragem. 

Quando estamos dormindo e começamos a sonhar, temos sensações, entramos em disputas, fugimos ou regozijamos. Aí acordamos (...) e pensamos que aquilo tudo acabou.
Quando sonhamos de olho aberto estamos fazendo a mesma coisa: projeções, esperanças, arrependimentos, raivas e medos que trazem consigo uma noção de solidez que igualmente ao sonho do sono não existe. Para tirar a prova, observemos que basta o celular tocar com uma mensagem do ser amado e tudo muda como num passe de mágica! Aquilo que nos afligia ou inebriava cessa por alguns instantes, misteriosamente. 
Não haveria problema se isso não nos causasse sofrimento: pequenas desatenções, pequenos acidentes, grandes desatenções e grandes descuidos com o outro, imerso nos seus tantos outros problemas e sonhos. Descuido conosco mesmo, sobretudo. 
Fortalecemos assim nossa separação com o mundo externo  e com a realidade construtiva dos fenômenos, desenvolvendo um individualismo sonolento e perigoso. Deixamos de apreciar a riqueza que é acordar e sentir tudo como uma projeção interna, inseparável do momento que estamos experimentando. 
Seja numa curva de estrada, numa discussão de trânsito ou ainda numa simples falta de percepção das nossas reais necessidades e das pessoas à nossa volta, sonhamos acordados com um mundo que não está lá e que se dá a impressão que está, acaba no mesmo instante.
Corremos desenfreados como se estivéssemos num sonho - desses que vivemos à noite, na cama, aquecidos. Não muito diferente da própria vida e da morte, usufruindo da liberdade infinita das nossas mentes. 

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Paulo Leminski

nunca cometo o mesmo erro

duas vezes

já cometo duas três

quatro cinco seis

até esse erro aprender

que só o erro tem vez


(Paulo Leminski)

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Lucidez e engano

Dona Norma está triste. Assim que a cumprimento ela se lamenta por não conseguir mais andar. Um choro tímido descortina o desejo de se mexer, de não mais depender da caridade alheia, de viver uma vida de outros tempos. Aos 84 anos ela ainda não percebeu por completo que o tempo é o tempo, e que o corpo é o corpo.
Ao lado dela está a sorridente Dona Alice. Por trás de uma confusão mental que alterna momentos de esquecimento, doçura e fúria, ela me olha com um ar de encantamento simples e infantil. Sem que eu pergunte nada, faz um elogio e sorri tímida, satisfeita.
Já Dona Gioconda é um abraço só. Parece querer um abraço e só. Abre os braços como quem já perdeu a vergonha de demonstrar e pedir carinho... impossível não sorrir e não retribuir com o abraço mais caloroso que houver. Impossível não sorrir um pouco mais.
Minha tia, motivo inicial da minha visita, já não me reconhece: apesar de um corpo ainda operante, seu cérebro vive um sonho de gradual esquecimento e desapego. Irmãs, filhos, netos e sobrinhos são menos que poeira para aquela mulher de 81 anos. No entanto, a mãe (minha avó) nunca é esquecida. É como se ela estivesse retornando ao ponto de origem gradualmente.
"Nega" não se casou. Ouço sua história e percebo um certo bom-humor ao contar que seus dois noivos morreram pouco antes de subirem ao altar com ela. Pergunto (brincando) se estou seguro ficando ali ao seu lado e a resposta é uma gargalhada. Sei que estabelecemos uma conexão e então ollho pro lado.
Lá está Dona Olga. Dormindo, com uma sonda que invade seu frágil corpo pelo nariz. Imóvel. Cansada. Sonha sonhos de outros mundos (suponho) e tudo que posso fazer é rezar perto dela e sussurrar ao seu ouvido que tudo está bem. Que tudo ficará bem. E que ela mantenha a calma, haja o que houver.

Ouço sorrisos e histórias divertidas. Mas também vejo a dor, as saudades, a carência e os olhares distantes. Como em Dona Odila que espera (im)pacientemente pela filha que nunca chega. De bolsa a postos, repete de forma ininterrupta que voltará para casa a qualquer momento; que está ali apenas fazendo companhia para as outras senhoras e senhores por um tempo. Conta suas aventuras culinárias num tom nostálgico e reclama mais um pouco, de tudo.
Tranquilamente está Dona Carmem, que fala com muita clareza e vivacidade sobre o marido italiano e a relação por vezes dura no casamento, sobre os cuidados com os filhos e sobre uma vida que ficou para trás. Ela, uma das poucas pessoas de corpo ainda saudável daquela sala, confessa que tem vontade de comer pêra. Simples assim.
Dona Marlene está brava comigo. Não gostou que eu tivesse passado a mão nas costas dela como sinal de acolhimento. Com grande dificuldade de articulação nas palavras, fala alto dizendo que aquilo não se faz e que é melhor eu ir embora. Tento uma reaproximação, mas nada feito. 

Fico mais um pouco  e paro por um instante para contemplar a paisagem e ver se aprendo alguma coisa. Observo numa fração de preciosos  e assustadores segundos a nossa capacidade de cometer tantos enganos, de perder tempo com disputas, jogos e emoções perturbadoras que não nos levarão a lugar algum! Tento imaginar quanto orgulho, raiva, medo, desejo e apego deve ter existido (e ainda existir) para aquelas pessoas e como é possível que em vários momentos elas tenham pensado que tudo estava muito bem e que valeria à pena todos os esforços para que o status se mantivesse. E que não perceberam que nada, absolutamente nada se mantém igual por pouco ou muito tempo.
Perplexo concluo que isso acontece com todo mundo sempre. Respiro.

Quanto arrependimento e mágoa pode haver por trás daquelas rugas e semblantes desanimados? Quantas vontades não saciadas ainda dormem naqueles corpos já tão combalidos? E a mais assustadora das perguntas não tarda a aparecer: como ficamos hábeis em deixar nossos queridos pais e mães, avôs e avós, tios e tias, amigos e amigas, esquecidos e escondidos, enquanto cuidamos da vida, dos mesmos jogos, raivas, apegos, medos e orgulho que eles mesmos um dia tentaram controlar? O que nos falta para acordamos e vermos que se tudo der certo (...), um dia estaremos lá também sucumbindo solitariamente a nós mesmos?! Onde está a dificuldade em enxergar que tudo aquilo pelo que lutamos fervorosamente não poderá nos ajudar quando nada de fato importar?

Como não percebemos o caminho, o engano e a repetição do mesmo padrão? 

Como não entendemos que desperdiçamos de forma absolutamente bem planejada, estruturada e orgulhosa aquilo que temos de mais precioso?...

Na hora de ir embora chego perto do Sr. Cláudio, que hoje não enxerga mais e pergunto um pouco desconcertado se está tudo bem. Ele me responde com um sorriso sem dentes e com um olhar opaco e distante, cheio de uma lucidez surpreendente: " está tudo bem, tudo ótimo".

E vou cuidar da minha vida. Dos meus jogos. 

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Drummond e "a melhor coisa da vida"

“Por isso, preste atenção nos sinais...
Não deixe que as loucuras do dia-a-dia
o deixem cego para a melhor coisa da vida: O AMOR.”

- Carlos Drummond de Andrade -

O céu e o concreto

O céu é.
o concreto acontece.
O que é concreto acontece onde há céu.
Sempre.

O concreto dói (de duro)  e doura
os passos.
O céu rói o tempo e molda o cansaço
Energia!

O céu seu é como o todo
E tudo do concreto passa a ser pouco menos.
O céu sim é feito um corpo
De concreto mudo que esqueceu-se de estar.

O concreto é raro quando junta-se ao céu
O céu é simples quando entende o "quê"
Impossibilidade há?
Não.

Sim, céu!
O concreto diz.
Mais, concreto!
O céu feliz

Sorri.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

sábado, 28 de setembro de 2013

Trigo e pão

Nossas inteligências vagueiam soltas, nuas e construídas. O fluxo dos pensamentos invade a segurança daquilo que em alguns momentos chamamos de paz. O sonho entorpecido do dia maximiza-se à noite quando a mente, de fato, livre, interpõe-se ao desejo de algo ser.
Isso já deixou de se tornar o que nunca foi: agora uma distorcida realidade equivale a uma doce confusão. E até que ponto vamos?
O lugar deixou de ter importância no exato instante em que a caminho pareceu infinito. A parada mostrou-se inócua no indefectível segundo em que o espaço revelou-se amplo e viável.
Certa vez ouvi de um mestre de uma tradição remota de um pequeno país: "não há trigo que sobreviva ao pão, e não há pão que sobreviva". Durante muito tempo minha insípida inteligência produtiva questionou a realidade do objeto que não perpassa nossos olhos - ora,  se não há trigo, nem pão... porém aos poucos foi e está aprendendo que pão, trigo e olhos são a mesma coisa e inexistem simultaneamente.
Aí ficou assim: sonho da realidade versus realidade do sonho. Nossos melhores métodos filosóficos  e científicos vacilam e continuarão vacilando enquanto o assunto for o "nada".
Por isso mesmo, permanecerão ignorando o derradeiro valor do "tudo".

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Tabacaria (Fernando Pessoa - Álvaro de Campos)


      TABACARIA
    Não sou nada.
    Nunca serei nada.
    Não posso querer ser nada.
    À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
    Janelas do meu quarto,
    Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
    (E se soubessem quem é, o que saberiam?),
    Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
    Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
    Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
    Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
    Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
    Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
    Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
    Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
    E não tivesse mais irmandade com as coisas
    Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
    A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
    De dentro da minha cabeça,
    E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
    Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
    Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
    À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
    E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
    Falhei em tudo.
    Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
    A aprendizagem que me deram,
    Desci dela pela janela das traseiras da casa.
    Fui até ao campo com grandes propósitos.
    Mas lá encontrei só ervas e árvores,
    E quando havia gente era igual à outra.
    Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?
    Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
    Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
    E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
    Gênio? Neste momento
    Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
    E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
    Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
    Não, não creio em mim.
    Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
    Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
    Não, nem em mim...
    Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
    Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
    Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
    Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
    E quem sabe se realizáveis,
    Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
    O mundo é para quem nasce para o conquistar
    E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
    Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
    Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
    Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
    Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
    Ainda que não more nela;
    Serei sempre o que não nasceu para isso;
    Serei sempre só o que tinha qualidades;
    Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
    E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
    E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
    Crer em mim? Não, nem em nada.
    Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
    O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
    E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
    Escravos cardíacos das estrelas,
    Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
    Mas acordamos e ele é opaco,
    Levantamo-nos e ele é alheio,
    Saímos de casa e ele é a terra inteira,
    Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.
    (Come chocolates, pequena;
    Come chocolates!
    Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
    Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
    Come, pequena suja, come!
    Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
    Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
    Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
    Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
    A caligrafia rápida destes versos,
    Pórtico partido para o Impossível.
    Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
    Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
    A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
    E fico em casa sem camisa.
    (Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
    Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
    Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
    Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
    Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
    Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
    Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
    Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
    Meu coração é um balde despejado.
    Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
    A mim mesmo e não encontro nada.
    Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
    Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
    Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
    Vejo os cães que também existem,
    E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
    E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)
    Vivi, estudei, amei e até cri,
    E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
    Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
    E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
    (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
    Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
    E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente
    Fiz de mim o que não soube
    E o que podia fazer de mim não o fiz.
    O dominó que vesti era errado.
    Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
    Quando quis tirar a máscara,
    Estava pegada à cara.
    Quando a tirei e me vi ao espelho,
    Já tinha envelhecido.
    Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
    Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
    Como um cão tolerado pela gerência
    Por ser inofensivo
    E vou escrever esta história para provar que sou sublime.
    Essência musical dos meus versos inúteis,
    Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
    E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
    Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
    Como um tapete em que um bêbado tropeça
    Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.
    Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
    Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
    E com o desconforto da alma mal-entendendo.
    Ele morrerá e eu morrerei.
    Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
    A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
    Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
    E a língua em que foram escritos os versos.
    Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
    Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
    Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
    Sempre uma coisa defronte da outra,
    Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
    Sempre o impossível tão estúpido como o real,
    Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
    Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
    Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
    E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
    Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
    E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
    Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
    E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
    Sigo o fumo como uma rota própria,
    E gozo, num momento sensitivo e competente,
    A libertação de todas as especulações
    E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
    Depois deito-me para trás na cadeira
    E continuo fumando.
    Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.
    (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
    Talvez fosse feliz.)
    Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
    O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
    Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
    (O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
    Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
    Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
    Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A ilusão da queda

Caímos. Dia após dia. Por períodos longos ou curtos. Conscientemente ou não.
Mas, caímos?
Se você resolveu continuar esta leitura mesmo depois que o verbo "cair" foi pontuado duas vezes seguidas e diferentemente, pode ser um bom sinal. Um sinal de que a certeza da queda pode não existir  de fato para você.
O mundo em que escolhemos viver nos faz uma proposta simples e sedutora a todo instante, sussurrando docemente para reunirmos condições propícias e intermináveis que gerem o nosso prazer imediato. E é aí que somos levados!
Muito menos pela condição natural de todas as coisas do que pela nossa própria avidez diante dos objetos que nos movem, olhamos e não percebemos que o início de cada processo já contém em si mesmo o seu final. Mas o mais grave é não sermos capazes de perceber nosso apego a esse ciclo.
Definitivamente (eis aí uma grande notícia) devemos olhar para as nossas vidas e diferentes caminhos com muita alegria, amor e fazer de cada etapa uma fonte de realizações e prosperidade. Contudo, se pudermos ir além disso teremos a oportunidade de observar como as coisas nascem, e que para vivermos dentro dessa tal "construção" é preciso apenas lucidez.
A pessoa lúcida percebe a verdade oculta de todas as coisas no próprio ato em que a vontade é soberana. O ser consciente enxerga que não existe queda porque não existe chão! Ora, quantas e quantas vezes passamos por situações de profunda tristeza e angústia e algum tempo depois estamos de pé, prontos para a próxima etapa? Quantas vezes a dor pareceu ser dilacerante e desmanchou-se no ar? Mesmo não sabendo agíamos com uma dose de lucidez e entendimento inatos que, agora, bem entendidos e treinados só poderão nos fazer bem.
A ironia de tudo isso é que mesmo quando não conseguimos nos levantar, também não paramos de cair (!). Aqui está mais uma prova de que não há chão... e se não houver chão, não há porque temer. E se não há porque temer, não haverá queda.
Longe de ser simples, esse esquema precisa ser levado ao ponto onde não realizamos construções, ao lugar de onde tudo vem e para onde tudo vai. Paremos por alguns instantes e contemplemos que, apesar da nossa sujeição à impermanência e à noção constante de queda, olhamos para os machucados e, gloriosamente, seguimos.
Essa é uma das mais importantes e enriquecedoras práticas de vida e nos trará benefícios na mesma medida em que levar a nossa mais positiva energia para o mundo. Melhor do que perceber a queda é identificar aquilo que parece nos derrubar.

Boa semana a todos!

Este texto é uma colaboração para o Instituto Aline Pastori
www.institutoalinepastori.com.br

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Nossas verdades, novos pensamentos.


Por sermos bombardeados pela assustadora velocidade de todas as coisas, pouco percebemos quem vamos nos tornando. A cada dia deixamos de observar o que de fato importa e que norte poderíamos tomar nas curvas e descidas deste fascinante viver. Essa pode parecer uma constatação desastrosa. Mas não é.
Temos uma vida preciosa, e ao observarmos todos os outros seres que nos cercam (com esforço, alguns até que não podemos ver...), perceberemos como temos bênçãos incontáveis para fazer da nossa rápida passagem por este planeta um estandarte de méritos e bem-estar coletivos. Por mais difícil que possa parecer às vezes, não devemos nos deixar enganar: cada dia é um dia de praticarmos o que temos de melhor, em todas as direções, sem esperar nada em troca, confiantes e exultantes.
Uma notícia (daquelas que não veiculam os jornais) pode parecer, porém, um pouco desanimadora: todas os aspectos das nossas preciosas vidas estão em transição - por pouco ou muito tempo, estão à nossa vista e ao nosso alcance e depois não estão mais...por mais força que façamos para tentar manter o que é bom e afastar o que não é tão bom assim, tudo vem e vai. E isso inclui a nós mesmos. Por isso vale à pena consultarmos nosso facebook íntimo e contemplarmos nossas postagens de alguns anos, meses, semanas e dias atrás. Quantas coisas diferentes.
Ainda que pensemos tratar-se de algo ruim, devemos repousar na sensação de que continuamos e seguimos ora trôpegos, ora faceiros. E na visão de que apesar das circunstâncias transitórias, há um ciclo incrivelmente permanente dentro da própria impermanência: se aquilo que é bom acaba, aquilo que não é acaba também.
A pergunta que pode nos tocar em algum momento é: por que somos assim? por que sonhamos determinados sonhos tão assustadoramente reais? por que pensamos de um jeito e agimos de outro? ou ainda, até quando seremos pegos de surpresa e arrastados pelas nossas emoções e pelas emoções dos outros?
Que verdade mágica, inexorável e avassaladora! E que oportunidade única de se reinventar a todo instante... quanta calma é preciso ter diante do(s) carma(s)!
As marcas trazidas em nossa mente e corpos sutis podem nos dar uma explicação de como estamos e do que somos feitos em determinado momento. E isso é tudo: se olharmos e não gostarmos do que estamos vendo, temos uma oportunidade de melhorar; se olharmos e gostarmos, ainda sim temos a mesma oportunidade. Só que aí de forma mais ampla, atingindo um número infinito de seres.
O sofrimento brilha para nós na mesma medida que o encanto, deixando-nos  presos à sensação de nadar no mesmo lugar, inertes. Coisas boas e ruins acontecem e podemos ter a sensação de apenas lutar para manter as circunstâncias que afastam a dor e aumentam o prazer. Que chance poderosa para podermos crescer e dar sentido à vida!

Escolhamos nosso refúgio, portanto. Sólido e indômito. Caloroso e real. Infinito e poderoso. A dor desaparecerá. O mar de pensamentos e sonhos se tornará calmo e doce. E os prazeres serão reais e absolutamente bem vividos. Passo a passo, respiração a respiração, via a via do caminho. Agora.

Samsara, felicidade tabajara.

Curioso, assustador. Confuso e sedutor.
O samsara trata-nos assim: entrega aparências e uma sensação de solidez quase real. E, longe de ser surreal, desmancha-se a cada tentativa de permanecer que nele fazemos.

Identidades, certezas, amores e maldades. Tudo o que é solido se esparrama à vista dos sentidos todos, entorpecidos. O pulso da aversão cintila sob o calor que desprende do peito e domina; gostar e não gostar já que mais possibilidades são....Senis convicções.

Estritos e restritos solfejamos o mundo inertes ao que somos de fato. E passamos a ser apenas o que temos sido. Sem o menor perigo de dar certo. Seguindo, apenas. Segundos.

Samsara diz que entrega, mas a fome continua. Samsara diz que faz, mas jaz tranquilo na soberba ignição dos desejos incríveis. Samsara ilusão , contigo contidos iludimo-nos contudo confusos distantes.
E pedimos mais.

Só esquecemos de perguntar: mais de que?

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

A meditação de cada dia


A meditação de cada dia

E então, já meditou hoje? Se a resposta for sim é um ótimo sinal. Se for não é um sinal melhor ainda, pois pode ser tempo de iniciar essa prática incrível de auto conhecimento e remoção de obstáculos do dia a dia.
Eventualmente podemos ter muitas abordagens a respeito do tema e acabamos criando um mito sobre um ato tão simples e belo.
A meditação não é uma prática religiosa. Ela participa ativamente, no máximo, de uma boa prática espiritual mas sem ser a prática em si. Meditar é desenvolver a capacidade de olhar para dentro de si mesmo sem obscuridades, sem medos e sem censura. É, sobretudo, a nossa ligação com o que temos de mais natural e precioso: a natureza calma e acolhedora desprendida das condições externas e dos condicionamentos seculares.
Por isso mesmo é uma prática extremamente simples e que causa um efeito imediato. Seja por 5 minutos ou 2 horas,  a serenidade que se pode experimentar é transformadora. E o melhor é que está em cada um de nós, o tempo todo e para sempre!
Sobre uma almofada, sentados de pernas cruzadas, na posição birmanesa, em posição de lótus completo ou de meio lótus, ajoelhados com o auxílio de um banquinho ou ainda numa cadeira,  posicionamos a coluna ereta, o queixo levemente retraído e as orelhas paralelas aos ombros. Os olhos mantém-se semi abertos num ângulo de 45 graus aproximadamente. As mãos podem ficar sobre os joelhos ou em posição de mudra cósmico*.  Os músculos da face ficam relaxados e a língua toca levemente o espaço entre céu da boca e os dentes da frente.
A respiração, nosso foco principal, é toda feita no abdômen e pelas narinas .
Ah, existe uma regra obrigatória para a prática da meditação: não sofrer. Se a posição escolhida estiver causando dor ou muita dormência nas pernas, basta mudar e ir adaptando-se aos poucos.
O atividade inicial é parar um instante, posicionar-se e observar a respiração no seu ritmo natural e principalmente desprender-se do controle. A mente continuará fazendo o que sempre faz, mandando uma infinidade de idéias, lembranças, sensações e todo tipo de imagens; nosso único trabalho será deixar que esse mundo interno passe e se perca no infinito. Se algum pensamento nos pega e nos leva, não sofremos... apenas, de forma gentil, retomamos o foco na respiração e seguimos.
É importante entender que meditar não significa dormir, nem atingir um estado de letargia qualquer (embora isso possa acontecer). O objetivo principal da meditação é conduzir nossas mentes para um local sereno e atento, onde uma presença real mas desapegada do controle observa o mundo e a nós mesmos natural e compassivamente.
Boa prática!
Link para as posições do corpo e das mãos: http://dharmabuda.blogspot.com.br/2008/11/posturas-de-meditao.html

Este texto foi uma colaboração para o site do "Instituto Aline Pastori."
http://www.institutoalinepastori.com.br

sábado, 3 de agosto de 2013

Impressões, expressões, pressões - por Juliana Notari.


A cabeça latejou a noite toda. O corpo também. Saio as ruas, não vejo, não cheiro, não escuto... as pessoas não estão ali presentes. Estão encapsuladas em moldes e formas, de sentir e ver e tocar e interagir. Duro. Brutal. Comodidade de uma sociedade estranha sem entranhas. Devo sentir como o outro, mesmo que a preciosidade do desejo e do pensamento seja intimo e impossível de ser atingido. Temos e é único. Mas tudo é externalizado e vazio, sem cheiro, sem gosto, sem tato. Ao mesmo tempo encaixotado hermeticamente.
Desço as escadas de onde vivo e sempre penso que quando ao abrir a porta do prédio, já estarei numa batalha poética, explosiva , agressiva que é ser e se assumir , nua de mascaras. Fatiga, a tenho. Mas não cesso de agir. As minhas opções agridem pessoas próximas. O simples jeito que me alimento, como me transporto de um lugar para o outro nesta cidade, como olho pras pessoas, e como demonstro meus desejos e vontades, agride. Mas alguns não, aqueles próximos íntimos com quem troco e escambo o dia-a-dia, o cotidiano de pensamentos e essa batalha. Aos amigos. Agradecida, verdadeiramente pela vossa existência, por abrirem seus odores, dores, alegrias, e pele, e gritos incomuns e orgânicos.
As cápsulas herméticas serão rompidas?
Só de respirar você oxida. Estamos expostos ao tempo. Bonito.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Esperanto

A espera pode.
Ser bela, estranha, estrangeira,
Talvez.

Esperança que de tanto em tanto
Reinventa-se
À margem.

Esperanto
Língua real dos prazer honestos
Simples
Infinitos.

Esperanto:
Esperando.
Esperado.

domingo, 23 de junho de 2013

Revolução da evolução

Estranheza.

Quando foi que governantes gostaram de manifestações?
Quando foi que quem governa está ao lado de quem manifesta?

Manifesta-se?

Quando foi que a manifestação precisou atrelar-se à pacificidade das caras pintadas?
Quando foi que a manifestação auto designou-se as cores nascidas nas matas derrubadas, na terra saqueada, no céu obstruído e no ideal manipulado?
Quando foi que a cidade teve paz?
Onde foi que a cidade...

Manifestação sem barulho não é manifestação. É passeata, só.

Manifestação sem ação não é revolução! Nunca.

Questões, questãs, estão:

O que se quer? ...... interesse.
Quem quer?     ...... revelação.

Para quem se quer? ...... supremacia.

Revolução da evolução é ação e mais que ação.
É não, cordão e chão para o que vem:

dissonância e transformação de tudo
e de nada.
                                                                                           
                                           

sábado, 22 de junho de 2013

17/6 - 21/6

Primeiro me empolguei.
Como é lindo ver as pessoas nas ruas,
onde apenas havia os carros.

Depois tentei passar adiante a sensação, a informação.
Entre sinais de concordância, discordância e paralisia
Percebi, mas não pude reagir aos sinais de ceticismo que vi.

Pois de fato, o fato
Não vi.

Agora está claro,
e tão claro quanto, triste:

A direita opressora e ditatorial está vencendo;
a pequena imensa classe média está fazendo as vezes de soldados da burguesia.
E sobre o pretexto de não aceitação partidária e de uma falsa liberdade nacional nacionalista
começa a desenhar a face de um fascismo fácil
que se mostrara adormecido.

Verde e amarelo. Deitado esplendidamente.
Porém acordado estava dentro da cegueira toda que desnivela, derruba e aniquila a existência humana.

Tudo muito bem orquestrado por aqueles que supostamente
Estariam sendo achincalhados.
Os poderosos. Concordantes.

Eles que, o tempo todo, deram as cartas e jogaram os dados.

Até agora.

E agora?

terça-feira, 18 de junho de 2013

Tudo o que é sólido se desmancha no ar

Cidades. Protestos.
Por vinte. Por milhares de vozes. Barulho.

Centavos. Milhões de vozes. Silêncio.

Polícia que bate. Repense.
Polícia que solta. Propensa.

No meio do tudo. O nada.
Desmanchado para quem quiser ver.

Céu parado, montanhas em movimento.
Tudo o que é solido fica assim:

À mercê. Do:
Vento, som, tempo, sol.
Lento mar, receber é dar.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Matrix

Matrix.

Que filme!
A realidade e a realidade.

A vitória parcial das máquinas.

A fé.
A iluminação.
A paz.

Que filme, Matrix!

O olhar perdido da pergunta
já não é mais o mesmo
do olhar que renasce do sangue, das balas
Fugazes.

Matrix, que filme?

O que assisti hoje pela terceira ou quarta vez.

Mais que descoberto,
O caminho deve ser percorrido.

Eis que então: ter ou não ter?

Pago logo somo
Sumo apago longe
sonho.

Medo agora
mãe e senhora

aonde

Foi parar
o tema, o ar

responde!

pois, o que vale
menos:
ser a ter,
ou ter o ser?






Lucidez.

Hoje fiz uma visita à minha tia mais velha que atualmente mora em um asilo. Foi a comemoração do aniversário de 81 anos dela. Numa sala espaçosa, outros cerca de 15 idosos assistiam silenciosamente à uma novela, para qual vez ou outra despertavam em um interesse real.

Embora eu já tivesse ido buscá-la algumas vezes, nunca havia subido à casa de repouso.

Adorei que, quando ao chegar, minha tia teve dificuldade para me reconhecer... ou seja, ela tinha outras coisas bem mais importantes pra pensar ou lembrar, do que ter-me na sua retina mental. Olhos cansados, olhos distantes e olhos atentos: o ambiente de lá é um farol de vida (ainda que isso soe estranho).

Entre pães, bolos e refrigerantes ouvi relatos tristes e outros esperançosos de pessoas que se sentem abandonadas. Poderia arriscar que são pessoas habituadas, mas não conformadas com a distância dos entes queridos que a elas é imposta.

Que lição de vida pode-se aprender num ambiente assim! O ar se movimenta mais lentamente, mas nem por isso menos intenso do que do lado de fora. É como ver um filme que ainda não está pronto e que todos poderemos passar futuramente (...). Sejam nossos pais, sejamos nós mesmos, como será que é a sensação de ser deixado para "terminar" longe de tudo e de todos que conhecemos e nos afeiçoamos? E para quem deixa seus parentes já cansados e às vezes doentes, lá? Como será que é?

Que oportunidade de enxergar o que realmente importa. Ao pensar que ao ouvi-los o mais atentamente possível eu estaria lhes dando algo extraordinário, fui surpreendido com a sensação de receber alguma coisa imensa, intensa e esclarecedora. Proporcional a todos aqueles anos de vida somados.

Obrigado Dona Norma, Sr. Nelson, Dona Alice, Dona Ondina, Dona Maria e todos os outros senhores e senhoras queridos que me deram uma das mais valiosas lições que um ser humano pode aprender.

Medo de rato.

Quem não procura...acha!

Concorda
Respira
Entende
Relaxa.

Espera
Esquecido
Embora.
Que acha!

Olhar
Reprimido
Em vão
Se debate

Vai menos
Vem mais
Muda o som

Disparate.

domingo, 9 de junho de 2013

Livres!

Sempre vale à pena contemplar e se encantar.

Como livre são as crianças!

Jogam capoeira sem a esperança do equilíbrio. Apenas giram e suam.

Soam (...)

Apresentam-se num palco sem ilusões.

Acreditam e sonham.

Sobem (...)

Como livre são as crianças que,

capazes de sorrir em paz,

Professam a grande sabedoria.


sábado, 8 de junho de 2013

Guru (?)

Tempos de guru...(propaganda da Vivo - junho/2013)


Eu tenho algumas....

Quando podemos começar?


sexta-feira, 7 de junho de 2013

Nada é por acaso, tudo é por aceso.

Se nada é por acaso, de onde vem o "tudo"?

Se nada é por acaso, onde está o "tudo"?

Tudo é energia movida.

Se pra bem ou mal, é. Apenas.

Energia movida, brilha olho, move corpo, gera quero.

E...

Fogo!

Nada é por acaso, nem o fogo que ilumina mas que, intenso, queima e rompe.

Nada é por acaso.

Tudo é por aceso, iluminado de luz sem fogo. Calmo.

Com folga.


Bodisatva no metrô.



Simples.

Dinamarca

Há vida na Dinamarca.
Há dias na vida.
Em que há a marca

do que ficou e do que ainda não sabemos que está.

Há frio na Dinamarca.
E no mar de dínamo

                                Flutuamos,

i    n    s    o    n    e    s, às vezes.

Há sol na Dinamarca.
Há sol na Dinamarca?

Disto, nada marcado caminha: liberdade.


Obra prima




"...de modo que o meu espírito ganhe um brilho definido...

 e que eu espalhe benefícios...

tempo, tempo, tempo, tempo."

"Mission", by Rush. (to M.)



Grande música. Grande banda.


Entre uma respiração e outra

Entre uma respiração e outra, fica o espaço do nada.
E por isso, o preenchimento do tudo, do todo.
Sabedoria primordial que se manifesta na forma de calma, foco e liberdade.

Quem é nada, pode ser tudo.
Quem tem nada, tem tudo!

E tudo está dentro do todo.
Dentro de cada um, desde sempre. Nonada*

À prática entregamos a esperança dos dias. Como um sonho, lúcido. Lúdico.

Ou sim:

Eis o caminho!

Sonho.

*uma das muitas palavras criadas por Guimarães Rosa. Essa inicia o grande romance "Grande Sertão Veredas".

O dia do varal. Do varal esticado pelos bambus.

Filho: "Que legal, bambus segurando o varal! Me lembra a infância!"

Mãe: "Pois é...a mim também...nunca pensei que fosse passar por isso de novo..."

Filho: "Poxa, na verdade quis dizer que me lembra uma época divertida da minha vida. Brincadeiras num quintal grande, alegria."

Mãe: "Pra mim também. Mas outras coisas surgem, não tão legais."

Filho: " Entendo."

Mãe: "E a minha tia, que disse outro dia: 'já faz mais de um mês que o vendedor de bambus não passa por aqui.'"

E então rimos. 

(...)

terça-feira, 4 de junho de 2013

Virya

Motivação

Poderosa mente que fica
Sob uma alinhada motivação.

É liberdade conseguida na simplicidade
daquilo que sempre

Foi...já.

Se clara, ilumina os pensamentos
Traduzindo-os: momentos repletos de fugacidade contida.
Se clara-menos,
Calma-mais.

E assim acontece.

Como a simplicidade de um bambu que busca o calor no ar,

no varal.

De varal.